Conta-se que certa vez Sol e Lua se desentenderam. O relacionamento mais sólido que a cidade já havia visto estava rompido. O motivo, segundo ambos, eram as inúmeras e infindáveis discussões. Lua alegava ter alertado. Dizia ela que o relacionamento vinha sendo negligenciado pelo parceiro. Sol, conhecedor de seus erros, tentou, por muito tempo, reconquistar a amada que dia após dia insistia em fugir.
Para os que não conhecem, vou relatar (como me foi contada) brevemente a história de amor dos dois:
Sol e Lua, primos de sangue, viviam num mesto lugarejo chamado Via Láctea. Sol, mais velho, um líder nato, sentia-se absoluto e portava-se como se todos ao seu redor fossem, em certa medida, dependentes de seus brilhantes dotes. Filho de uma mãe sábia, dona Bang, Sol nunca assimilou a informação de que a humildade era uma das qualidades mais louváveis e importantes que se pode ter. Apesar das milhares de vezes que ouviu estas palavras da boca de Dona Bang.
Lua, uma menina linda e admirável, muito nova, não saia da barra da saia de sua mãe, Terrinha. Apesar de sentir o medo de encarar todo o universo de possibilidades que a vida lhe apresentava, Lua sempre teve uma personalidade bastante forte e controlava as marés que embalavam a disposição de ânimo das pessoas que a cercavam.
Pulando os entremeios e partindo ao acontecimento de fato, devo dizer que o relacionamento começou quando, numa bela noite de verão, ambos se encontraram na festa de aniversário da avó de Sol, que por conseguinte viria a ser tia-avó (ou qualquer um desses níveis de parentesco que inventam) de Lua. Dona Eclipse foi o ponto de ligação que faltava. Apesar de serem primos, nenhum dos dois havia antes reparado no outro.
Várias são os relatos de que o relacionamento entre ambos vivia as mil maravilhas. Não havia quem observasse o encontro dos dois e não dissesse que não foram feitos um para o outro. Sol e Lua eram perfeitos unidos e, quando distantes, pareciam incompletos. Sempre havia no ar algo que sugeria faltar alguma coisa.
Aos dez milhões de meses de relacionamento houve a primeira briga. Ninguém se lembra o motivo. De certo o ciúme de algum dos dois. Sol, possessivo que só ele, foi ciumento durante todo o relacionamento. Ora brigava por causa de Saturno (um casinho antigo), ora Netuno (colega de classe) e ora Plutão (um pseudo-astro que fazia sucesso com as novinhas da cidade). Fato é que ele sempre se sentiu intimidado por Lua. Seu prestígio e sua imponência estavam ameaçados por uma mocinha novinha que, pela primeira vez em toda sua existência, acabara com sua capacidade de raciocinar logicamente.
O relacionamento durou até o rompimento cerca de 2 bilhões de anos e alguns milhares de meses. As discussões cresceram e Sol se perdeu. O orgulho não permitiu que voltasse atrás e Lua deu um fim ao problema. Quando do término, Lua parecia fria. Sol até hoje jura que nunca entendeu tamanho distanciamento.
Com o tempo, encontros e desencontros se sucederam. Várias foram as oportunidades de estarem juntos. Muitas deram certo. Outras, nem tanto. Todos ao redor perceberam o clima tenso. Terrinha não demonstrou ter se importado com o término. Mas, coitada, não poderíamos exigir isso dela. É de se esperar que uma mãe fique ao lado da filha. Entretanto, outras tantas pessoas se manifestaram. Inclusive uma amiga antiga de Lua, que, também terminada recentemente, fez força para a não reconciliação.
O relacionamento de fato não durou. Ainda é cedo para dizer, mas pelos milhares de meses que se passaram, é provável que esta história não tenha novas páginas escritas. Orgulho, rancor, incapacidade de mudar e aprender e falta de vontade são obstáculos.
Sol sofreu, mas como bem diziam os sábios: "O tempo é o remédio para tudo". E o tempo parece estar cicatrizando as feridas, ou ao menos anestesiando. A verdade amigos é que a vida é uma caixinha de surpresas. Não sabemos o que nos aguarda na próxima curva e só podemos acreditar e tentar fazer o melhor.
Essa história é parte integrante do corpo de experiências de vida do mundo. A trouxe aqui hoje para puro entretenimento. Desacredito que as histórias com finais felizes existam como são contadas nos livros. Mas, acredito que querer fazer é, necessariamente, poder fazer. E acredito ainda mais que só nos basta um olhar carinhoso para os acontecimentos, atenção com aqueles que nos cercam e vontade de fazer melhor para transformar o mundo.
Gustavo Dias
Que lindo!
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