Uma estava deitada num sofá, confortável, com o olhar distante e os pensamentos viajando por paragens que não podemos aqui visualizar. Outra estava sentada à mesa, com seu computador às mãos, fazendo diversos cálculos e inúmeras operações, nem todas matemáticas, procurando dar sentido à vida. Ambas se gostavam. É... Acho que se gostavam. Mas pouco se entendiam. Sabe como é, né. Pensamentos dissonantes...
- Hoje você está mais longe que o comum.
- Hã?
- Tá pensando na morte da bezerra, mas lá no Japão.
- Ah. Nada. To é por aqui mesmo. Nesse Brasil enorme.
- Hmm. E tá passeando por onde no Brasil?
- Pertinho. Tão perto que você se assustaria... E longe também.
- Mais uma vez dividida entre dois amores. Um daqui e um de acolá.
- Nada. Ah, não são amores. São dois caras bacanas, mas não os amo. Nenhum mesmo.
- Aham. Agora tenta me enganar mais uma vez. Tô te dando outra chance.
- É sério. E esse é o problema. Eu gosto deles, mas não sei de qual eu gosto mais.
- Então fica com o de perto.
- Fácil assim?
- É... Seja prática uma vez na sua vida. De que adianta arrastar correntes por alguém que tá bem longe, e provavelmente se divertindo aos montes por lá, enquanto você fica aí, esparramada nesse sofá, pensativa. Vai viver!
- E se o de perto for um erro.
- Diverte com o erro, oras. Depois joga fora.
- Pra você tudo é tão fácil. Não tem nenhum sentimento aí dentro?
- Tem sim. E muito. Só não deixo que eles me dominem e me impeçam de viver. Tem muita gente querendo divertir, mas nada tão sério. E pra que vou ficar perdendo tempo amando alguém que não quer amar. Olha, ninguém vai sair vivo dessa festa que estamos participando, tá.
- Medo!
- Medo de mim?
- Não, você! É você que tem medo de se apaixonar e perder essa vida dinâmica, autodedicada, e... Vazia... Isso, vazia que você tem. Se faz de durona, de forte, mas se desmancha toda aí por dentro, e se ressente por não ter um amor verdadeiro aí pra dividir não só problemas, mas muitas alegrias com você.
- Não. Você é que tem medo de enfrentar o mundo sozinha. Precisa se ancorar em amores que certamente partem unicamente de você, e não retornam correspondidos. Mas você prefere se machucar reiteradas vezes que enxergar que o mundo é apenas uma diversão. Ninguém quer nada sério com ninguém.
Uns minutos de silêncio tomaram conta do ambiente. Elas sabiam que trocaram verdades. Mas nenhuma das duas era capaz de dar o braço a torcer, e aceitar a realidade. E, na verdade, nenhuma delas conhecia realmente o significado de amor. Até porque amar, já dizia o poeta, foge de todo e qualquer tipo de explicação. Amor é um lugar onde o entendimento não pode chegar.
- Não vamos tirar nada dessa conversa, né?
- Acho que sim. Cada uma de nós tem sua verdade.
- E não vamos aceitar a verdade da outra.
- É...
- É!
E outra vez elas ficaram caladas. Voltaram para seus mundinhos particulares. Uma sonhando, e a outra realizando. Duas que perfazem uma só mulher. Vozes do inconsciente. Egos que não se alteram. E mais uma vez, esta dualidade impediu que a mulher tomasse logo sua decisão e encaminhasse sua vida. E Mais uma vez a mulher continuou mergulhada em seu abismo de dúvidas, sem saber se é melhor seguir a soberana razão ou seu irremediável coração.
Leonardo Távora
Parabéns, Léo!
ResponderExcluirAmei o texto. Conseguiu retratar bem nós mulheres. Rs. Bjo
texto de quem sabe o que escreve.
ResponderExcluirparabens pelo site.
Parabéns Léo, nos instiga a ler cada vez mais, sábias palavras....
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