Eu não tinha as pernas mas te tinha, todo dia, o tempo todo.
Vi de perto cada mudança tua, teu rosto ter e não ter formas. Vi o pálido, o branco, vi o normal.
Te vi nu em pêlo, te vi sem eles também.
Me lembro das luzes das árvores quando estavas aqui, e como doía falar das pernas de outras moças, das danças delas e das vozes. Eu sempre fui só uma flor.
Te tinha aqui, na mesa, na cama, nas cadeiras, nos meus livros, fotos e até num rabisco na parede.
Anéis nunca usados, pingentes guardados.
As toalhas sujas, o farelo no chão, teus presentes, uma sacola de moedas.
Fomos felizes por entre louças, panos de prato e morangos, e sei que ainda seremos muito mais.
O depois de amanhã nos reserva algo que não podemos imaginar. Nenhuma flor jogada ao vento foi em vão, nenhuma inspiração sairá sem glória.
Nesses dias sozinha que ainda me restam, rezo para que eu possa sempre ser a menina dos teus olhos, a tua mão, o teu pedaço, o teu refúgio, tudo que te faltava.
Rezo para ser única! E que não exista nenhuma outra estranha além de mim.
Que eu possa te inspirar, te fazer respirar, te tirar o ar.
Que eu possa ser tua, tão tua quanto minha. E que tu possas ser meu.
Que não existe nada além, nem porém, nenhum outrem.
Que sejamos assim.
Desde a esquina de um outubro até outra vida. Que não termine, que não tenha fim.
E se por acaso precisar ter, que o culpado desse seja os sete palmos.
Fomos felizes em cada madrugada, no terraço, em cada trago, cada abraço, cada toque mais profundo. Nas paçocas, na doença, nos medos vomitados, nas tristezas costuradas. Nas paredes sem cor, nas lágrimas.
Fomos felizes. Somos e permaneceremos assim.
Na saúde, na brisa, na alegria, na canção, na criação, no lado. Um do outro.
Andresa Alvez
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