Os jogadores

Muitas vezes falamos do amor como sendo um sentimento que envolve prioritariamente o emocional das pessoas. Não é raro ouvirmos que por amor se cometem loucuras que, muitas vezes, em um “Estado normal”, não se faz de maneira alguma. Concordo que isso é verdade, mas não em sua totalidade. Existem pessoas que são tão racionais, que acabam por refletir isso em relacionamentos também. Isso não faz de ninguém melhor ou pior que alguém. É tão somente um modo de enxergar a vida. Sentimentais se jogam, morrem de amor. São capazes de entregar-se de olhos vendados às pessoas. São românticos. Apenas românticos. 
As pessoas ditas racionais geralmente trazem consigo essa falta de sentimentalismos – erroneamente encarada como frieza – de uma vida um tanto quanto mais dura na infância, ou na adolescência. São pessoas que foram vítimas de pequenos sabotadores, que lhes atormentavam a mente quando esta ainda estava se formando. Criam como que uma armadura, uma proteção que usamos para afastar de nós o que já nos fez mal em algum momento de nossas vidas. Todos nós temos essas armaduras. Em maior ou menor grau, quando nos relacionamos, nunca somos totalmente transparentes. Dizem, inclusive, que isso dá um sabor à relação. 
Pessoas racionais são como jogadores. Jogam com sentimentos. É um jogo muito complexo e delicado, pois, além de potencialmente fazer mal à pessoa com quem se relaciona, essa brincadeira pode ferir – e muito – o coração do próprio jogador. O amor é um sentimento muito traiçoeiro, e não raras vezes, pode nos envolver de um modo que não esperávamos, e do qual muito dificilmente conseguimos sair ilesos. Tem gente que não é capaz de matar uma formiga e, por amor, torna-se um assassino. Tudo porque, em sua mente, essa pessoa não é capaz de lidar com a perda da pessoa amada, que provavelmente é um jogador racional, e simplesmente se desinteressou por aquele sentimento com aquela pessoa. 
E quando um jogador é traído por sua racionalidade, e começa a amar, de verdade, outro jogador? Aí, caro leitor, a chance de uma hecatombe nuclear é infinitamente maior. Porque é natural do ser humano achar que é o centro do universo, e que todos os que amamos devem orbitar em nossa volta. Se entre duas pessoas ditas emocionais as cobranças e as amarras são grandes, infinitamente maior é o apego e o sentimento de posse de duas pessoas racionais, que se vêem envolvidas no jogo do amor de um modo que não se esperava. Isso porque os racionais são mais calculistas que os sentimentais. Eles esperam o momento certo de dar o bote, como se estivessem não mais que normais, quando, por dentro, estão envolvidos por sentimentos diversos, que eles mesmos jamais esperavam. 
Para o bem ou para o mal, os extremos nunca são salutares. Claro que morrer de amor é uma forma poética de se acabar, mas é infinitamente melhor viver com esse sentimento. Nada é tão triste assim. A vida pode ser boa para todos, sim! Mas só podemos viver saudavelmente quando nos despirmos de nossas armaduras, que nos fazem ter preconceitos e conceitos sedimentados, porém mal formados. Não digo que se deve fazer isso para se entregar de olhos vendados ao instável solo do amor. Mas é preciso ser mais claro se quiser que contigo sejam também mais límpido. Caso contrário, nós, seres humanos, estaremos fadados, pela eternidade, a sermos jogadores. Os jogadores de sentimentos. Meros bobos que acham que podem brincar de dominar no complexo e insolúvel terreno do amor.

Leonardo Távora

Um comentário:

  1. Para um romântico, você sabe bem o que se passa na mente de um jogador. Nós, jogadores, temos esse título tão cheio, tão poderoso, mas somos covardões por dentro. Medrosos. A gente analisa o tempo todo, joga o tempo todo e, quase sempre, machuca os outros o tempo todo. Tudo isso porque, realmente, encontramos sabotadores, pessoas que "ensinaram" que amar é ser ridículo, que você vai sair fodido. Então a gente analisa demais. E, quase sempre, termina sozinho. Não que seja ruim, mas aprendemos muito mais com a gente do que com os outros. O chato é não ter com quem dividir isso.

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